O acervo conta com publicações do diário em diferentes idiomas e releituras.

Há histórias em quadrinhos e fantoches, criados pela Escola Municipal Anne Frank. Foto (Charles Mascarenhas)

Por Charles Mascarenhas – publicado pela revista Dom Total

Setenta anos se passaram desde a publicação da primeira edição do Diário de Anne Frank, escrito originalmente em holandês, em junho de 1947. De lá para cá, o diário já foi traduzido para mais de 70 línguas e tem emocionado milhões de pessoas ao redor do mundo.
Para comemorar estes 70 anos, a Escola Municipal Anne Frank, situada no bairro Confisco, na região da Pampulha, em Belo Horizonte, disponibilizou seu pequeno acervo para exposição na Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais.

O acervo conta com publicações do diário em diferentes idiomas e releituras. Um deles é um exemplar raro do Diário de Anne Frank de 1947, escrito em holandês, doado à escola por Nanette Koing, colega de classe de Anne Frank e sobrevivente do holocausto. Há também uma edição em francês de 1950, pertencente ao Instituto Histórico Israelita Mineiro. Além destes, há histórias em quadrinhos e fantoches, criados pela Escola Municipal Anne Frank. Esses e outros elementos para contar um pouco da biografia da garota judia, vítima do regime nazista.

Além da exposição, que leva o nome de “Anne Frank: a história do diário que comoveu o mundo”, a biblioteca contou com uma programação diferente. Na última terça-feira, 27 de setembro, a BIJU, sigla referente ao setor infanto-juvenil da Biblioteca Pública, recebeu a ilustradora e artista plástica, Mirella Spinelli, que fez uma releitura em quadrinhos do Diário de Anne Frank, e conversou com jovens que visitaram a exposição.

Além do Diário Anne Frank, Mirella já fez outras releituras em quadrinhos, para a coleção Mestres da Arte em Quadrinhos, cuja proposta é apresentar a obra e a vida de artistas de destaque no universo da História da Arte. Ela já transformou Vicent Van Gogh, Leonardo da Vinci em HQ´s. Atualmente ela está no processo de colocar Michelangelo em quadrinhos.

Em entrevista, Mirella Spinelli, Sandra Mara e Vanessa Mendes disseram acreditar que a história da judia, Anne Frank, é também um gatilho para se discutir diversos temas com os jovens.

Mirella contou o motivo de ter escolhido fazer uma história em quadrinhos sobre o Diário de Anne Frank.

“Durante o processo de transformação em HQ do Mestres da Arte em Quadrinhos, eu foi convidada a transformar Anne em HQ, pois completariam 70 anos desde a publicação da primeira edição do Diário. Para mim foi um desafio porque é diferente, quando eu escrevo a minha história e quando eu tenho de trabalhar no texto de outra pessoa.”

Mirella falou ainda sobre como a história de Anne Frank é recebida pelos jovens. “Eu tenho ido a algumas escolas falar para jovens. E numa dessas idas, eu tive uma experiência que foi muito interessante, porque eu fui a duas escolas de níveis sociais diferentes. Ou seja, são universos diferentes. Porém, eu percebi que nos dois lugares os jovens se identificaram com a leitura do Diário. Cada um por motivos completamente diferentes. Os de classe “AA”, a sobrevivência não é uma questão para eles. Mas, eles continuam sendo adolescentes, continuam tendo conflitos dentro de casa. Eles conseguem se colocar no lugar da Anne numa situação de confinamento, de guerra, então eles se identificam de acordo com o ponto de vista deles. Já na escola Anne Frank, que pertence a uma outra realidade, é uma população mais carente, a sobrevivência é a questão principal. Eles se identificam enquanto grupo, então eles se sentem oprimidos e buscam na escrita e no desenho, o desejo de mudar alguma  coisa.”

Localizado em uma área de vulnerabilidade social, o bairro no qual a Escola Municipal Anne Frank está inserida tem uma história de lutas, dificuldades e acima de tudo de muitas conquistas. Diretora da escola há seis anos, Sandra Mara se enche de orgulho ao falar das grandes conquistas que a escola vem adquirindo, graças aos esforços de toda a comunidade do Confisco. “Recentemente fomos premiados por um projeto coordenado pelo nosso professor de história, Moacir Fagundes. Junto com os estudantes desenvolvemos um HQ, contando a história do Confisco com participação especial de Anne Frank!”

Por este projeto, a escola foi premiada com o Prêmio Nacional de Educação em Direitos Humanos, na Categoria A (Educação Formal), promovido pelo Ministério da Educação (MEC).

Sandra Mara falou ainda da relação que os estudantes da Escola têm com a biografia Anne Frank. “Existe uma interconexão entre os estudantes e a biografia de Anne Frank. Eles se identificam no sentido da exclusão dos direitos, dos sonhos, na luta pelos direitos humanos, na luta contra o racismo. O trabalho que a escola tenta fazer com os estudantes é construir a interconexão que existe entre a vida de Anne Frank e a vida dos estudantes.”

Sobre o regime que matou milhões de pessoas na Europa, Sandra foi questionada sobre a atuação da escola quanto ao desenvolvimento de trabalhos voltados para questões como respeito e tolerância. “Tentamos combater todo tipo de intolerância. No projeto – HQ produzido pela escola – trabalhamos com questões de gênero. Por exemplo, a história do Confisco, que contamos na história em quadrinhos, é contada por mulheres negras.”

Esperançosa, Sandra quer preservar a memória do confisco. “Pensamos em construir um banco de memória da comunidade e a escola sempre está tentando resgatar a história do Confisco, seja através do teatro, do cordel do Confisco, colcha de retalhos e agora com a história em quadrinhos.”

Já Vanessa Mendes, diretora da BIJU, conta como surgiu o interesse em expor o acervo da escola. “A BIJU trabalha com exposições, e neste ano, em razão dos 70 anos da primeira publicação do diário de Anne Frank, pensamos em trazer uma obra tão importante para a história. Então a     Biblioteca Pública desenvolveu uma parceria com a escola, que já vem fazendo um trabalho bem importante nessa área, para que mais pessoas possam ter conhecimento sobre a biografia de Anne Frank.”

A exposição na BIJU vai até o dia 30 de setembro, e depois volta para a Escola Municipal Anne Frank, que fica no bairro Confisco, na região da Pampulha.