Podemos nos perguntar: como é que Jesus conseguia se comunicar com uma multidão sem sistema sonoro, sem o microfone? Certamente, ao sentar-se numa barca, por exemplo às margens do lago de Genesaré, suas palavras alcançavam melhor os ouvintes (cf. Lc 5,1-11). As palavras que proferia em montanhas ou lugares elevados também se serviam do ambiente para serem ouvidas. Faça a experiência: sente-se numa cadeira na praia e comece a ouvir as conversas descontraídas de quem está na água. Ou, estando próximo a uma montanha, escute a nitidez da fala de quem está em posição mais alta. Pelos cenários do evangelho, percebe-se que, certamente, Jesus tinha boas noções da acústica do planeta Terra.
Estudando a evolução da engenharia, sabe-se que, nas construções do império greco-romano, se usava muito o semicírculo, evidência da descoberta de que o som reflete melhor de baixo para cima, atuando com a acústica própria da natureza. Durante a Idade Média, a preocupação maior era na hora de construir o púlpito: uma pequena varanda ou balcão que dava para a nave da igreja, bem à vista dos fiéis, de onde falava o orador. Este, dotado de uma pequena ou média voz, mas sempre preparada e projetada com força na direção da assembleia, conseguia fazer-se ouvir, beneficiando-se também da localização física do púlpito, situado num lugar elevado. Se, obedecendo às leis da física, o som vai para cima, como se fazia nesse caso, em que a assembleia ficava embaixo? Muito simples: a voz reverberava no teto, nas colunas e chegava à assembleia com atraso, mas chegava.
Vale ressaltar que a sonorização é um elemento litúrgico articulador, pois, sem ouvir a Palavra, a homilia, as orações e o canto litúrgico adequadamente, as pessoas saem da igreja mais ou menos como entraram ou até ensurdecidas pela parafernália de barulhos similares aos que já enfrentam no cotidiano. Quando vão à igreja, deparam com algumas dificuldades, como ruídos, chiados, som reverberante, microfonia, além de gente mal preparada para proclamar as leituras. Somando tudo isso, às vezes a celebração se torna um sacrifício (distinto do de Jesus!) tanto para o presidente como para a assembleia, que não consegue celebrar tranquilamente e tem de suportar os ruídos na comunicação. Hoje em dia está em voga a palavra comunicação em todos os setores da Igreja, no entanto a aplicação prática do conceito não é tão frequente, pois muitas vezes nem sequer se ouvem as leituras e a homilia do padre.
A inteligibilidade da fala sempre foi um dos maiores desafios para designers de sistema de som que lidam com espaços reverberantes. O mau conhecimento das tecnologias usadas nas caixas acústicas é a maior fonte de insatisfação na sonorização, pois uma onda sonora sem direcionamento adequado vai entrar em conflito com a arquitetura, provocando aquele efeito de eco ou de reverberação, cuja ação deixa a voz ininteligível, embora ofereça volume à musica. Consequentemente, a primeira exigência dos párocos deve ser a prioridade da voz para poder transmitir as leituras, as orações, a homilia, evitando o volume musical ensurdecedor típico das casas de shows.
Para resolver o problema da deficiência na escuta do que é pronunciado e cantado na liturgia ou do incômodo com o excesso de barulho, sons, reverberação, volume além do necessário, têm surgido novas tecnologias que, se usadas adequadamente, conseguem dar boa resposta ao desafio, possibilitando a transmissão de um som claro e inteligível em ambientes que pareciam totalmente avessos a qualquer solução.
Além da tecnologia, é importante, para atingir melhor qualidade sonora em ambientes muito reverberantes, fazer tratamento acústico nos espaços, quando necessário. Igrejas grandes, com arquitetura de teto alto, com muito granito, vidros, azulejos, paredes lisas, sem pintura, sem madeira, são o ambiente perfeito para a reverberação, inimigo número um da inteligibilidade sonora. Quanto mais liso e grande for um templo, maior a probabilidade de o som reverberar, o que provoca atraso na chegada da voz aos nossos ouvidos, ficando, assim, um som misturado, incompreensível. Geralmente isso acontece porque o som sai de um alto-falante comum grande, em geral mal posicionado – fórmula perfeita para que o som passeie no ambiente antes de chegar aos ouvidos dos fiéis. O som reverbera porque ricocheteia no espaço, muitas vezes em razão de superfícies duras e reflexivas e também de caixas acústicas de má qualidade. Percebe-se um desconhecimento sobre isso da parte de engenheiros ou arquitetos, pois o processo de construção evoluiu sem pensar na sonorização, tratada como um dos últimos elementos do planejamento. E corrigir custa mais caro do que pensar junto, no momento da construção ou reforma, qual o arranjo ideal para a sonorização do ambiente sagrado.
O ricochetear do som provém de sua refletividade sobre as superfícies. Se combinadas, essas refletividades geram um ambiente extremamente barulhento no qual fica difícil compreender as palavras faladas. Todos já tivemos essa experiência em igrejas, salões de festas ou outros ambientes em que o resultado é semelhante. Um exemplo também bastante corriqueiro são os aeroportos, um dos tipos de ambientes mais reverberantes que existem. Neles as caixas acústicas, normalmente presas no teto como arandelas, lançam os feixes de som que, atingindo o chão, são jogados novamente para o alto pelo granito. O som desliza e ricocheteia, dificultando a compreensão das palavras. Existem hoje aeroportos que estão modernizando o sistema de som a fim de torná-lo adequado para a audição; é o caso dos de Abu Dhabi, Nova York, Boston, Paris, Londres e o maior aeroporto da América Latina, o de Guarulhos, em seu mais novo terminal internacional.
A chave de êxito das novas tecnologias é a capacidade de fazer o som sair direto de caixas adequadas e bem posicionadas. O som sai como um tiro a laser até alcançar seu alvo, os ouvidos das pessoas presentes na assembleia. Ele é formatado como feixes de luz direcionados e focados, sendo enviado diretamente para os ouvintes quase livre de reverberações, independentemente da medida da altura da nave ou de seu poder de reverberação.
Alto-falantes tradicionais produzem sons que, na maior parte das vezes, se dirigem ao ouvinte, mas também vazam para outras direções. Esse som é inútil e indesejável, torna-se fonte de barulho e reverberação e piora à medida que a pessoa se distancia dele. Para resolver essa questão, a única solução vinha sendo a colocação de várias caixas acústicas próximas e direcionadas, não obstante a consequente perda estética. Com o avançar da tecnologia, porém, foram desenvolvidos sistemas tecnológicos modernos que empregam a física natural para formar o som com um número menor de caixas acústicas e proporcionar audição inteligível, além de incumbirem a harmonização a um sistema central, à parte do sistema da música. É hoje a melhor adequação em termos de custo-benefício.
Houve uma evolução considerável nas tecnologias necessárias à boa sonorização e transmissão da voz, com destaque para a tecnologia line array, patenteada na Europa em 1957, que apresentou uma evolução com relação à fabricação e ao modo de gestão dos alto-falantes, contando com três linhas principais de caixas acústicas: linha analógica (a mais antiga); linha semidigital, sistema processado ao nível da caixa; linha digital (a última tecnologia). As três linhas têm em comum o fato de que a onda sonora saída do alto-falante é direcionada em linha reta, ao contrário dos alto-falantes convencionais, cuja onda sai em círculo ou em forma esférica, batendo em todas as direções e criando eco e reverberação nas paredes, no teto e no chão.
A diferença entre uma linha analógica e uma linha digital verdadeira é que uma coluna de linha digital é composta de alto-falantes guiados cada um por um processador. Isso permite direcionar em três direções a onda sonora, focalizando até as zonas restritas de uma nave e proporcionando assim inteligibilidade de alta qualidade, além da redução da quantidade de caixas. Essa solução permite, no interior da maioria das igrejas, a boa transmissão da voz, deixando apenas a reverberação arquitetural influir em parte sobre a inteligibilidade. A linha analógica permite uma qualidade satisfatória na inteligibilidade da voz, mas com certa fraqueza na transmissão da música, priorizando as frequências de voz com um alcance inferior. Dessa forma, será necessário maior número de pontos repartidos na igreja, o que exige mais frequente manutenção.
Já faz um ano que, no Brasil, é possível encontrar soluções intermediárias usando as caixas semidigitais, cujas possibilidades garantem a transmissão equilibrada entre voz e música. Essas novas caixas são, na maioria, importadas. São consideradas semidigitais pelo fato de terem condição de modificar de forma eletrônica a faixa sonora, interferindo tanto na largura quanto no alcance da faixa.
Um dos problemas maiores encontrados na sonorização das igrejas é o desconhecimento das técnicas adequadas por parte dos numerosos responsáveis: a tecnologia line array, a única que reconhecidamente resolve o problema da inteligibilidade, é muitas vezes mesclada, de forma inadequada, com sistemas em coluna cujos alto-falantes não respondem aos critérios de transmissão vertical e horizontal exigidos pela tecnologia.
Não é porque uma comunidade é pobre que não pode ter um som de qualidade. Hoje existem soluções para cada uma; de toda forma, muitas vezes é melhor não fazer nada do que instalar o sistema de som recomendado por uma pessoa sem experiência ou sem o respaldo de profissionais em instalações nas igrejas. Muitas vezes se constata que as igrejas direcionam recursos para um piso de granito ou para outras coisas de menor prioridade e deixam a sonorização como um investimento secundário.
Iluminação e introspecção
Outro grande desafio nas igrejas é a iluminação, que implica a renovação da parte elétrica, sem a qual não se pode ir adiante nesse aspecto. Uma iluminação ambiente para um espaço sagrado precisa proporcionar claridade na medida certa. Uma igreja escura pede iluminação correta para valorizar a arquitetura, os objetos sagrados. Uma igreja extremamente clara pode tirar do ambiente a sutileza da introspecção, tão importante para a concentração na oração. Um momento orante pede uma luz que provoque leve adormecer dos sentidos, para que se experimente olhar para dentro, se inspire e expire profundamente no ritmo da serenidade. Num país tropical como o Brasil, as pessoas estão mais habituadas a estar “do lado de fora” – existe certa dificuldade no “estar dentro de si mesmas”; com isso, o ambiente, a luminosidade nos orienta no caminho da volta ao centro do coração, para ali encontrarmos o sagrado!
Por Helena Ribeiro Crépin / Natividade Pereira, fsp
Publicado originalmente Vida Pastoral Paulus